IV.TRANSPORTE E TURISMO

Inegável é a constatação de que a globalização trouxe consigo um notório crescimento económico e uma série de consequências, dentre elas, podemos destacar o aumento do chamado turismo de massa, impulsionado por diversos fatores, aliados a uma melhor oferta do mercado turístico.

Tendo em conta que o turista necessita dos meios de transporte para deslocar-se ao destino eleito, notória há sido a multiplicação do serviço de transporte, com todas as consequências que este fenómeno pode representar, seja na ampliação de infra-estrutura ou aprofundando ainda mais a identificação entre turismo e transporte.

Partindo da premissa de que todo turismo implica uma viagem cabe-nos aqui fazer menção a própria definição de turismo trazida pela OMT (Organização Mundial do Turismo) que o define como: " (…) A soma de relações e de serviços resultantes de um câmbio de residência temporário e voluntário motivado por razoes alheias a negócio ou profissão." (13) Segundo o professor Lacerda Badaró: "cumpre diferenciar viagem e turismo. O turismo inclui a viagem apenas como parte de um todo, uma vez que pode haver diversas viagens dentro de um mesmo destino turístico. Já a viagem, no sentido amplo do termo, pode ter diversos objetivos, não necessariamente turísticos, como por exemplo, viagens de negócio, de estudos de compromissos sociais e outras."

Seguindo este pensamento concluiremos que todo turista é um viajante, porém, nem todo viajante é um turista. A atividade turística por si mesma se caracteriza além dos aspectos já ditados pela OMC, pela busca de novos caminhos e lugares, está revestida por um caráter de exotismo e distância do habitual e pode ser entendida como necessidade inerente a pessoa humana, ainda que mais perceptível em algumas pessoas que em outras, porém sempre presente.

Essa atividade, ainda que na sua origem ou em tempos passados tinha um caráter bastante elitista, apresentando-se muitas vezes como um privilégio dos mais abastados economicamente, nos dias atuais em virtude das transformações anteriormente mencionadas pode ser observada com frequência nas demais camadas sociais. Essa expansão nos direciona a outro planteamento não menos importante do ponto de vista jurídico que é o fato de que o turista, na grande maioria das vezes celebra um contrato de transporte, esse contrato pode se dar diretamente com o transportista ou ainda através de um tour – operador, porém em qualquer dessas situações são usuários do serviço público de transporte.

Segundo Torres Lana, o turismo conta com um conjunto normativo constituído de três grandes núcleos (14) podemos dizer que o serviço de transporte se encontra inserido no terceiro grande grupo desse conjunto normativo, que se preocupa em regulamentar a intervenção direta da administração através de serviços públicos. Diante disso, não há nenhuma margem de dúvida de que o usuário de um serviço de transporte, em muitas situações, será um turista.

O turista que utiliza o serviço de transporte se caracteriza como consumidor e usuário nos termos do CDC (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor), e como tal é portador de uma vulnerabilidade peculiar (15) e portanto portador de um direito de proteçao que se planteado com o devido cuidado conduzirá ao entendimento de dois tipos de normas, de caráter de proteçao ao consumidor e normas específicas de proteçao ao turista como consumidor, em virtude de que a peculiar vulnerabilidade do consumidor nesse caso encontra-se ampliada (16).O artigo 2º do CDC brasileiro, define que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, e em seu parágrafo único reza que equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. O exposto no parágrafo único permite caracterização do direito de terceiro beneficiário do serviço de transporte, independentemente de ser ele parte contratante ou não.

Diante dessa explanação verificamos que o turista encontra o amparo e a proteçao que lhe é pertinente dispondo além do sistema imposto pelo Código de Defesa do Consumidor de um sistema de proteçao estabelecido pelo Código Civil que dedica ao contrato de transporte, o Código Civil brasileiro se preocupou com o tema dedicando ao contrato de transporte um capítulo específico e que pode ser invocado em conjunto com o CDC (17).

A proteçao do turista usuário do serviço de transporte alcança dimensões supranacionais e mais uma vez a EU se destaca por demonstrar um cuidado com o tema e estabelecer um sistema jurídico de protecção. Convém mencionar o significativo e quiçá um marco legislativo comunitário que foi a Resolução do Conselho, de 2 de Outubro de 2000, sobre os direitos de passageiros de linhas aéreas (18), com o objetivo de informar melhor os direitos dos passageiros de viagens aéreas. Muitos foram os avanços comunitários com relação a protecção de turistas usuários de transporte, que nos permite afirma a importância de num futuro desenvolver um estudo mais específico sobre o tema (19).

Um exemplo que não poderíamos deixar de abordar é o exemplo Espanhol, um país que tanto se destaca pela quantidade de turistas que recebe quanto pela quantidade de turista que emite a outras localidades, essa característica de país emissor e receptor e que tem no turismo um dos seus mais significativos produtos, propiciou o desenvolvimento de um sistema interno de proteçao que aborda as várias modalidades de transporte assim dispostas:

a)Normativas de proteçao ao viajante que utiliza o sistema ferroviário, que impõe entre outras coisas a existência em cada estação de um registro de reclamações, onde o consumidor poderá consignarem suas reclamações contra a empresa bem como seus agentes ou empregados.

b)O transporte rodoviário vem regulado pela Ley 16/1987 de 30 de Júlio e pelo regulamento aprovado pelo Real Decreto 1211/1990 de 28 de Setembro, que estabelece o catálogo de obrigações do transportista, sancionando seu incumprimento.

c)O transporte Marítimo vem regulamentado pelo Real Decreto de 28 de Março de 1984 que trás relativo avance ao impor que se publique itinerários, tarifas, frequências e toda as condições gerais do contrato de transporte a ser realizado.

d)O transporte aéreo que foi primeiramente regulamentado pela Ley 48/1960, de 21 de Júlio de navegação aérea e actualizado pelo Real Decreto 2333/1983, de 4 de Agosto e atualmente conta com um corpo normativo no sentido de favorecer a harmonia contratual no setor.

No Brasil, apesar de não encontrarmos ainda um corpo normativo específico de proteçao ao turista viajante, podemos dizer que as disposições constantes do Código Civil de 2002 a respeito do contrato de transporte, juntamente com o Código de Defesa do Consumidor, oferecem uma base legislativa segura e que permitirá o desenvolver paulatino desse ramo jurídico.

Em sentido supranacional e nacional, podemos afirma que o turista usuário do serviço de transporte, tem nos termos das leis consumeristas a proteçao dos seus direitos que poderiam ser especificados como saúde, legítimos interesses de segurança e económicos, reparação de eventuais danos, sem esquecer todavia de algumas açoes protecionistas que deverá realizar a empresa transportista como por exemplo a celebração de um contrato de seguro, não obstante a faculdade de realização de um seguro por parte do turista viajante.

Assim concluímos que o transporte se apresenta como atividade indispensável ao desenvolvimento da atividade turística e como tal, merecedor de uma atenção especial e de constante avaliação tanto em caráter geral e especificamente jurídico.