CONCLUSÃO
O caminho a ser seguido para mudança da escola [da educação] é o mesmo caminho que o povo já vem trilhando em busca da solução para tantos outros problemas de sua vida cotidiana. Ao invés de esperar que as soluções venham de cima (das autoridades, do governo, dos especialistas) o povo mesmo resolveu agir. Discutindo junto, em pequenos grupos e comunidades, ele começou a tomar consciência de sua própria força e sua capacidade de descobrir soluções novas (Ceccon et alii, 1998, p. 90-1).
Verificamos que a profissão interfere na saúde das pessoas, trazendo como conseqüências doenças como a síndrome de burnout e de depressão, advindas também do estresse laboral, e que refletem no local de trabalho, onde os sintomas sobre o nível de estresse e tolerância evidenciados na pesquisa são alarmantes. As trabalhadoras entrevistadas, em sua maioria, encontram-se estressadas, intolerantes e em burnout. Esta situação denota que as relações humanas delas devem estar, possivelmente, deterioradas, seja entre elas próprias ou entre elas e os estudantes, os pais, as mães ou responsáveis ou com os demais membros da sociedade. Percebemos que as pessoas entrevistadas, para a sobrevivência, trabalham mais de oito horas por dia, o que ocasiona uma sobrecarga, isso sem considerar as exigências profissionais, como formação continuada, leituras, avaliações, atualizações, atividades extraclasse – correções de trabalhos, provas etc –, higiene, manutenção e segurança do espaço físico, bem como as atividades domésticas e o cuidar dos filhos.
Como verificamos, a maioria das trabalhadoras em educação não tem tempo para o lazer e o lúdico. Conseqüentemente, a profissão é um perigo, e, como uma panela de pressão, poderá estourar na saúde física e mental das profissionais e também no processo de ensino-aprendizagem e pesquisa. Nessa pesquisa, privilegiamos as possíveis conseqüências da síndrome de burnout e de depressão na saúde mental das pessoas que trabalham na educação. Infelizmente, a pesquisa demonstrou a falta de conhecimento, por parte das trabalhadoras em educação, do que seja a síndrome de burnout e, também, do que venha a ser, realmente, a depressão. O próprio termo saúde mental não é bem visto por diversas pessoas, observamos, durante todo o processo da pesquisa de campo nos anos de 2003 e 2004, a insatisfação, o constrangimento e o preconceito com o uso, ocorreram alguns casos de pessoas tentarem nos convencer a não adotá-lo, sugerindo outros, como mal-estar, burnout e sofrimento psíquico. Esse fato está vinculado ao que disse uma entrevistada: "eu pareço pinel, louca".
Nós não abordamos nessa pesquisa a relação da história da loucura, da psiquiatria, dos manicômios e da saúde mental, mas acreditamos ser ele um tema que precisaria ser investigado junto às trabalhadoras em educação, a representação simbólica que há por trás do termo saúde mental e quais suas conseqüências na busca de tratamento, seja na medicina convencional, seja no tratamento espiritual.
Constatamos que as trabalhadoras em educação buscam a religião nos casos de problemas com a saúde porque ela proporciona conforto, respostas aos porquês das doenças e o restabelecimento da vida simbólica e da nomia. A busca pelo tratamento espiritual no espiritismo está vinculado à teodicéia explicativa da religião. Para 95% das entrevistadas, o tratamento realizado no espiritismo proporcionou melhoras na sua saúde e, para 84%, a religião ajudou profissionalmente. Isso denota, também, o vínculo entre educação, saúde e religião.
A terapêutica espírita não se resume ao que é recomendado pela Federação Espírita Brasileira em suas orientações documentais, também não há um consenso na literatura espírita sobre o tema. Percebemos que o tratamento espiritual espírita é realizado com autonomia pelos grupos religiosos e nem os rituais realizados por um grupo nem sempre são os mesmos do outro. O que há de comum em todos é a oração, os passes, a água fluidificada e a palestra. A forma da prática e da implementação do ritual dependerá de cada grupo, da orientação dos mentores espirituais e da administração local. A busca por tratamento espiritual no espiritismo se dá em situações as mais diversas, como problemas emocionais, psicológicos, físicos, familiares, mentais, curiosidades, espirituais e/ou materiais. Todas as pessoas que procuram são atendidas e não são questionadas nada sobre sua vida pregressa, situação econômica ou a religião que freqüenta. O sigilo, a ética, o respeito e a discrição foram elementos comuns aos grupos pesquisados.
A teodicéia espírita extrapolou e ampliou a tipologia weberiana (2000) complementada por Berger (1985). Segundo a nossa compreensão, percebemos elementos da teodicéia da promessa de compensação num ‘além’, mas os espíritas dirão que isso dependerá do livre-arbítrio das pessoas, do processo de evolução e de amadurecimento espiritual, pois, para o espiritismo, o que a pessoa é em vida enquanto encarnada, será quando morrer (desencarnar), já que as pessoas não mudam suas atitudes, seus pensamentos, suas práticas e convicções só porque morreram. Estaremos no ‘além’ de acordo com as leis de ação e reação e de causa e efeito, podendo, em razão disso, a pessoa estar em moradas felizes ou não. No espiritismo, há elementos da doutrina do Karma, mas, para os espíritas, a pessoa pode e deve mudar as situações que, porventura, sejam karmicas, ela não deve se sucumbir, acomodar e ficar apática porque "é culpa do destino", "Deus quis assim", e "um Karma, nada vai dar jeito". O espiritismo acredita que, com o cultivo de bons pensamentos, com a prática da caridade, da oração, da reforma íntima, pagando o mal com o bem e com uma fé racionalizada, nós seremos assistidos pelos bons espíritos, que nos fornecerão forças e ajuda para superar os problemas, as dificuldades e ter a compreensão do que está ocorrendo. E evidenciamos, também, elementos do dualismo, a guerra e o duelo entre o bem e o mal. Para o espiritismo o mal existe, mas o bem é latente em todas as criaturas de Deus. Assim, para os espíritas, o demônio ou o diabo são espíritos como nós, mas que fizeram escolhas que os levaram a estar nesse grau de imperfeição, e dependerá deles arrependerem-se e fazerem outras escolhas e, com certeza, um dia serão espíritos de luz. Finalizando, teríamos outros elementos para continuar justificando que a teodicéia espírita extrapola e amplia a tipologia weberiana complementada por Berger, porém, acreditamos que os elementos aqui trazidos são suficientes para apoiarem essa afirmação.
Será que o motivo de as entrevistadas de Goiânia buscarem a terapêutica espírita é o mesmo de trabalhadoras na educação de outros municípios de Goiás, do Centro-Oeste e das outras regiões brasileiras? Como está a saúde mental das trabalhadoras em educação de outros municípios de Goiás, do Centro-Oeste e das outras regiões brasileiras?